Saúde Indígena: Racismo Estrutural/Institucional, Colonialismo Interno e Necropolítica

Autores

DOI:

https://doi.org/10.20435/tellus.v23i50.917

Palavras-chave:

saúde indígena, Racismo Estrutural/Institucional, colonialismo interno, covid-19, necropolítica

Resumo

Várias ações que caracterizam nosso cotidiano político constituem marcos de uma Necropolítica, isto é, uma política pautada na morte como dano colateral aceitável alicerçada pelo Racismo Estrutural/Institucional. Exemplo disso é o uso de bactérias e vírus como estratégia de eliminação de indígenas, que foi relatado por vários pesquisadores ao longo da história da relação do Estado brasileiro com estes povos, de maneira que não se trata de algo episódico, mas uma opção política de tratá-los como descartáveis. Este artigo tem por objetivo contextualizar a ação do Estado através de sua Política Indigenista na área da saúde, traçando uma linha de análise entre o Racismo Estrutural/Institucional e o Colonialismo Interno, evidenciando a ação do Estado na pandemia da COVID-19 como uma estratégia de uma Necropolítica. Utilizamos a Análise Documental como procedimento metodológico para analisar textos escritos, quais sejam, documentos oficiais, entrevistas e jornais. A análise foi feita a partir de recortes dos documentos, problematizando os discursos enunciados a partir da Teoria Decolonial. O recente governo federal (2018-2022) orquestrou um grande retrocesso na política indigenista do Brasil, ameaçando direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988, e a Pandemia da COVID-19 desvelou diversas mazelas sociais e econômicas, sobretudo o uso de estratégias de Necropolitica e do Colonialismo Interno, evidenciando a preponderância de uma lógica absolutamente racista/xenofóbica frente aos povos originários.

Biografia do Autor

Cláudia Maria Guimarães de Castro, Secretaria do Estado de Saúde de Mato Grosso (SES)

Doutora em Estudo de Cultura Contemporânea (ECCO) pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Assistente Social da Secretaria de Saúde do Estado de Mato Grosso/Escritório Regional de Saúde de Cáceres, e pesquisadora do Observatório de Saúde Indígena do Mato Grosso no Instituto de Saúde Coletiva/UFMT. Pesquisadora do Núcleo de Estudo do Contemporânea (NEC/UFMT).

Maristela Carneiro, Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT)

Doutora em História pela Universidade Federal do Goiás (UFG). Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO) pela Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Professora do Programa de Pós-graduação em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO/UFMT). Coordenadora do Núcleo de Estudo do Contemporânea (NEC/UFMT).

Referências

ALMEIDA, Silva. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen, 2019. [E-book].

ARAÚJO JUNIOR, Julio José. A Constituição de 1988 e os Direitos Indígenas: uma prática assimilacionista? In: BARBOSA, Samuel; CUNHA, Manuela Carneiro da (Org.). Direitos dos Povos Indígenas em Disputa. São Paulo: Editora Unesp, 2018.

ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL [APIB]. Repúdio contra o discurso anti-indígena de Jair Bolsonaro na Assembléia Geral da ONU. APIB [online], Brasília, DF, 2019. Disponível em: http://apib.info/2019/09/26/repudio-contra-o-discurso-anti-indigena-de-jair-bolsonaro-naassembleia-geral-da-onu/. Acesso em: 30 mar. 2020.

BARROS, Edir Pina. Saúde Indígena em Mato Grosso. In: GOLDENBERG, Paulete; MARSIGLIA, Regina Maria Giffoni; GOMES, Mara Helena de Andréa. Saúde Indígena: invisibilidade como forma de exclusão. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2004.

BARROS, Edir Pina. Vulnerabilidade social, aids e políticas públicas: uma contribuição da antropologia aos estudos de saúde indígena. [Relatório final de pesquisa de pós-doutorado em Antropologia Social]. São Paulo: USP, 2002.

BORGES, Rosane. O que é necropolítica? E como se aplica à segurança pública no Brasil. [entrevista concedida a Mariana Ferrari]. Ponte [online], [s.l.], 2019. Disponível em: https://ponte.org/oque-e-Necropolítica-e-como-se-aplica-a-seguranca-publica-no-brasil/. Acesso em: 23 jun. 2020.

BRASIL. Projeto de Lei n. 191/2020. Regulamenta o § 1º do art. 176 e o § 3º do art. 231 da Constituição para estabelecer as condições específicas para a realização da pesquisa e da lavra de recursos minerais e hidrocarbonetos e para o aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas e institui a indenização pela restrição do usufruto de terras indígenas. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2020. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2236765. Acesso em: 11 dez.2022.

BRASIL. Lei n. 12.314, de 19 de agosto de 2010. Altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, 8.745, de 9 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, e 8.029, de 12 de abril de 1990, que dispõe sobre a extinção e dissolução de entidades da administração pública federal; revoga dispositivos da Lei no 10.678, de 23 de maio de 2003; e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2010. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/ultimas_noticias/2010/20_ago_lei_sesi.htm. Acesso em: 23 out. 2022.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 1988. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/518231/CF88_Livro_EC91_2016.pdf. Acesso em: 2 fev.2019.

BRASIL. Ministério da Saúde. Relatório da I Conferência Nacional de Proteção à Saúde do Índio, Brasília: Mistério da Saúde, 1986.

CASANOVA, Pablo González. Colonialismo interno (uma redefinição) A teoria marxista hoje. Problemas e perspectivas. In: BORON, Atilio; AMADEO, Javier; GONZÁLEZ, Sabrina. A teoria Marxista hoje: problemas e perspectivas. Buenos Aires: CLACSO, 2007.

CASTRO, Cláudia Maria Guimarães Lopes. (Des)Mundos: Colonialidade do Poder e do Saber no Campo da Saúde Indígena. Curitiba: CRV, 2022.

CESARINO, Letícia. Colonialidade Interna, Cultura e Mestiçagem: repensando o conceito de colonialismo interno na antropologia contemporânea. Revista de Antropologia ILHA, Florianópolis, v. 19, n. 2, p. 73-105, dez. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175- 8034.2017v19n2p73.

CONSELHO INDÍGENA MISSIONÁRIO [CIMI]. Relatório: violência contra os povos indígenas no Brasil – Dados de 2021. Brasília: CIMI, 2021. Disponível em: https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2022/08/relatorio-violencia-povos-indigenas-2021-cimi.pdf. Acesso: 25 out. 2022.

CONSELHO INDÍGENA MISSIONÁRIO [CIMI]. Relatório: violência contra os povos indígenas no Brasil – Dados de 2019. Brasília: CIMI, 2019. Disponível em: https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2020/10/relatorio-violencia-contra-os-povos-indigenas-brasil-2019-cimi.pdf. Acesso: 25 out. 2022.

CUSICANQUI, Silvia Rivera. Ch‘ixinakax utxiwa. Una reflexion sobre practicas y discursos descolonizadores. Buenos Aires: Tinta Limón, 2010 [Resumo]. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 56, n. 2, 2013. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/82544. Acesso em: 4 mai. 2020.

DECLARAÇÂO DE ALMA-ATA. Declaração de Alma Ata sobre Cuidados Primários. Alma-Ata: OMS, 1978. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/declaracao_alma_ata.pdf. Acesso em: 20 jul. 2022.

FERREIRA, Luciana Ouriques. Entre discursos oficiais e vozes indígenas: a emergência dialógica das medicinas tradicionais indígenas no campo das políticas públicas. 2010. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Universidade federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010.

FRENTE PELA VIDA. Plano Nacional de Enfrentamento à Pandemia da Covid-19. Frente pela Vida [online], versão 3, Brasília, 2020.

INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL [ISA]. Plataforma de monitoramento da situação indígena na pandemia do novo coronavírus (Covid-19) no Brasil. 2020a. Instituto Socioambiental [online], São Paulo, 2020a. Disponível em: https://covid19.socioambiental.org/. Acesso em:30 mar.,2020.

INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL [ISA]. Relatório Ameaças e violação de direitos humanos no Brasil: povos indígenas isolados. São Paulo: ISA; Comissão Arns; Conectas Direitos Humanos, 2020b. Disponível em: https://mailchi.mp/socioambiental.org/relatorio-isolados-na-onu. Acesso em: 30 mar. 2020.

KRENAK, Ailton. Ailton Krenak: a potência do sujeito coletivo – Parte II. [Entrevista cedida a Julia Sá Earp]. Revista Periferias, Rio de Janeiro, v, 1, n 1, 2018. Disponível em: http://imja.org.br/revista/materia/a-potencia-do-sujeito-coletivo-parte-i/#_ftn0. Acesso em: 11 dez. 2022.

LANGDON, Jean Esther. Problematizando os Projetos de Medicina Tradicional Indígena. In: MINISTÉRIO DA SAÚDE; FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. Medicina Tradicional Indígena em Contextos – Anais da I Reunião de Monitoramento. Projeto Vigisus II/FUNASA. Brasília: Fundação Nacional de Saúde, 2007. p. 110-19.

LANGDON, Jean Esther. Salud y Pueblos Indígenas: Los Desafios en el Cambio de Siglo. In: BRICEÑO-LEÓN, Roberto; MINAYO, Maria Cecília de Souza; COIMBRA JUNIOR, Carlos. Salud y Equidad: uma merada desde lãs ciências sociales. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2000.

MBEMBE, Achille. Necropolítica: biopoder soberania estado de exceção política da morte. Revista Arte & Ensaios, Rio de Janeiro, n. 32, p. 123-151, dez. 2016. Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/ae/article/view/8993/7169. Acesso em: 23 jun. 2020.

MIGNOLO, Walter. A colonialidade de cabo a rabo: o hemisfério ocidental no horizonte conceitual da modernidade. In: LANDER, Edgardo (Org). A Colonialidade do Saber: eurocentrismo e ciências sociais – perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005. p. 33-49.

MIRANDA, Carlos Alberto Cunha. A arte de curar nos tempos da colônia: limites e espaços da cura. 3. ed. Recife: ED. Universidade da UFPE, 2017.

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO [OIT]. Convenção n° 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais e Resolução referente á ação da OIT/ Organização Internacional do Trabalho. Brasília, DF: OIT, 2011.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, Edgardo (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidad y modernidad/racionalidad. Peru Indígena [s.l.], v. 13, n. 29, 1992.

RAMOS, Alcida Rita. Indigenismo: um orientalismo americano. Anuário Antropológico [online], Brasília, v. 2011, n. 1, 2012. Disponível em: http://journals.openedition.org/aa/268. Acesso em: 08 jun. 2022.

TERENA, Luiz Eloy, GUAJAJARA, Sonia. Diga ao Povo que avance! Retrospectiva 2021 Povos Indígenas e a Luta pela Vida. APIBoficial [online], Ascurra, 2021. Disponível em: https://apiboficial.org/retrospectiva-2021/. Acesso em: 10 dez. 2022.

SENADO FEDERAL. CPI da Pandemia – Relatório Final. Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (Instituída pelos Requerimentos nos 1.371 e 1.372, de 2021). Brasília, DF: Senado Federal, 2021.

VIVEIRO DE CASTRO, Eduardo. O Governo declara guerras aos Índios. [Entrevista concedida a Bernardo Mello Franco e Fernanda Godoy]. O Globo [online], São Paulo, 16 fev. 2020. Disponível em: https://oglobo.globo.com/politica/eduardo-viveiros-de-castro-governo-declarou-guerra-aos-indios-24251561. Acesso em: 23 out. 2022.

VIVEIRO DE CASTRO, Eduardo. Etnologia Brasileira. In: MICELI, Sérgio; ZALUAR, Alba; CASTRO, Eduardo Viveiros de; PEIRANO, Mariza; SCHWARCZ, Lília Moritz; MONTERO, Paula (Org.). O que ler na ciência social brasileira (1970-1995). Antropologia I. São Paulo: Editora Sumaré, 1999. Disponível em: http://etnolinguistica.wdfiles.com/local--files/biblio%3Acastro-1999- etnologia/Castro_1999_EtnologiaBrasileira.pdf. Acesso em: 7 jun. 2020.

Downloads

Publicado

2023-03-02

Como Citar

Castro, C. M. G. de ., & Carneiro, M. (2023). Saúde Indígena: Racismo Estrutural/Institucional, Colonialismo Interno e Necropolítica. Tellus, 23(50), 323–348. https://doi.org/10.20435/tellus.v23i50.917

Edição

Seção

Dossiê: Resistências e estratégias dos povos indígenas contra o racismo e as violências coloniais