A danada da escola está lá: Educação Infantil vivenciada pelas crianças indígenas Tentehar maranhenses

Autores

  • Neusani Oliveira Ives-Felix Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
  • Luiza Nakayama Universidade Federal do Pará (UFPA)

DOI:

https://doi.org/10.20435/tellus.v18i36.488

Palavras-chave:

escola como espaço de fronteira, professor bilíngue, interculturalidade.

Resumo

O conhecimento de situações específicas sobre a escola indígena poderá contribuir para uma visão holística a respeito da escolarização de diferentes grupos étnicos e, assim, favorecer a construção de uma educação intercultural contextualizada. Este artigo investiga o processo de Educação Infantil (EI) vivenciado pelas pessoas que fazem a Pré-Escola Municipal Indígena Maíra-ira (PEI). A pesquisa realizada é de abordagem qualitativa do tipo etnográfico, e o referencial teórico-metodológico baseado em estudos sobre fronteiras étnicas e sobre escola indígena como espaço fronteiriço. Os instrumentos de coleta de dados foram: 1) levantamento de dados na Secretaria Municipal de Educação de Grajaú, MA (SEMED); 2) entrevistas semiestruturadas com um Professor Bilíngue (PB) e 3) conversas informais com a Assessora Pedagógica (AP), professoras da PEI, um ancião especialista e membros da comunidade. Constatamos que EI vivenciada na PEI ainda está fortemente arraigada às bases epistemológicas de um currículo eurocêntrico, portanto a prática do PB é fundamental na interação professor não indígena e as crianças, funcionando como uma porta para a valorização das tradições e da Língua Tentehar. A educação ofertada na PEI ainda não se configura plenamente em um diálogo contextualizado entre os saberes ocidentais e os tradicionais, pois a cultura Tentehar não está sendo nem o ponto de partida  nem o de chegada, do currículo vivenciado. Dentre os pontos de tensão, destacamos: as vozes ausentes dos Tentehar no currículo escolar, carência de material específico e diferenciado. Portanto somente o discurso oficial sobre a educação intercultural, sem condições reais de igualdade para que o intercâmbio aconteça, poderá ser muito mais um fator de exclusão social e cultural.

Biografia do Autor

Neusani Oliveira Ives-Felix, Universidade Federal do Maranhão (UFMA)

Professora assistente da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Tocantins (UFT); Mestre em Educação e Doutoranda em Antropologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Desempenhou a função de coordenadora pedagógica da SEMED, nas comunidades indígenas Tentehar, durante o período de 2008 a 2016. E-mail: neusani_26@hotmail.com.

Luiza Nakayama, Universidade Federal do Pará (UFPA)

Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação em Matemática e Científica da Universidade Federal do Pará (UFPA), na linha Educação e Povos Indígenas e chefe do Laboratório de Biologia de Organismos Aquáticos (LABIO - UFPA), na linha Etnobiologia e Etnoictiologia de comunidades indígenas amazônicas. E-mail: lunaka@ufpa.br

 

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Publicado

2018-08-20

Como Citar

Ives-Felix, N. O., & Nakayama, L. (2018). A danada da escola está lá: Educação Infantil vivenciada pelas crianças indígenas Tentehar maranhenses. Tellus, 18(36), p. 39–66. https://doi.org/10.20435/tellus.v18i36.488